Caríssimos,
Aquilo que começo agora a escrever refere-se a acontecimentos ocorridos há precisamente um ano, o que mostra bem a urgência com que tenho procurado manter-vos a par de tudo o que faço.
Há um ano atrás (18 de Junho de 2012) estava a ressacar da vitória da noite anterior, que confirmara a passagem da nossa selecção aos quartos-de-final do campeonato da Europa.
Depois das fortes emoções proporcionadas pelo jogo e de um check-out do hotel já atrasado, era tempo de relaxar e ver um pouco mais da cidade (Kharkiv, para quem não se recorda), enquanto aguardava a hora de partida do comboio no qual tinha lugar marcado.
Os cerca de 30ºC que se faziam sentir (semelhantes aos 30ºC que se fazem sentir neste momento à volta da minha pessoa) não convidavam a grandes caminhadas. Mas apesar disso e da estética menos conseguida do que já vira da cidade, acabei por não ficar parado.
Um pequeno aparte. Para mim foi notória a presença de notários por todo o lado. Talvez também seja assim em Portugal, mas julgo que nunca vi tantas tabuletas a dizer "Notário" (ou "Нотаріус", se preferirem) como na Ucrânia.
E, em mais um dos fabulosos botões existentes nos restaurantes por todo o país, pode observar-se uma representação precisa do aspecto e uniforme típicos das empregadas de mesa locais.
Ao final da tarde chegava a hora de me encaminhar para a estação ferroviária, para mais um comboio de longa distância.
Mas, contrariamente ao que fizera à vinda, desta vez faria a viagem de regresso a L'viv num comboio apenas. Tendo em conta as condições meteorológicas nessa altura, a perspectiva de passar dezanove horas num comboio não me deixava muito satisfeito, mas talvez só moderadamente satisfeito.
E foi uma viagem algo sofrida. Com mais de 30ºC dentro da carruagem era difícil não estar desconfortável, no mínimo. A única actividade que contrariava este problema era o sono profundo, e foi o que me permitiu passar boa parte da viagem sem que a temperatura me incomodasse de sobremaneira.
Ainda assim, a chegada a L'viv deu-se já durante a tarde do dia 19, e tinha mais uma vez uma longa espera pela frente.
Após a chegada, e já depois de reencontrar o grupo de Portugueses com quem tinha estado em Kharkiv, um duche era a prioridade, e foi possível após uma longa (ou assim pareceu) busca pela estação, que nos permitiu localizar as instalações destinadas a essa actividade de higiene pessoal.
Refrescados, fomos ao restaurante que eu recomendara. Qual? Pois claro, o Kumpel. A comida era boa, mas tinha mesmo de regressar pela cerveja.
Mais uma vez refrescados e sem fome, fomos até ao centro para subir ao edifício da câmara municipal e desfrutar de uma vista privilegiada sobre a cidade, caso contrário não teria foto nenhuma para mostrar.
Depois destas imagens, mais umas voltas para passar tempo, e das despedidas, desloquei-me para a estação de comboio mais uma vez.
Aí procurava um autocarro que me levasse até à central de autocarros, que ficava fora da cidade. A busca acabou por não resultar muito bem devido tanto à escassez de autocarros com esse destino naquele momento como a um mau planeamento da minha parte. Enfim, tinha todo o resto da viagem com que me preocupar, por isso um mero percurso de 5 quilómetros devia ser simples, pensava eu.
Um dos inúmeros táxis que aguardavam nas redondezas acabou por ser o meio de transporte mais eficaz naquela situação, e consegui assim preencher o meu lugar no autocarro nocturno da mesma empresa que me tinha levado para a Ucrânia um par de semanas antes.
Sabia que a parte mais complicada desta "aventura" seria toda a viagem de regresso de Kharkiv até Cracóvia, devido à distância e à ausência, ou pelo menos dificuldade, de descanso entre os vários percursos, e finalmente devido aos horários desses mesmos percursos.
A chegada a Cracóvia foi o culminar do cansaço dos últimos dias. Às 4h da manhã o discernimento já era pouco, o que me fez perder um pouco mais de tempo que o normal enquanto tentava situar-me para então poder seguir para o meu poiso do costume e poder finalmente descansar.
Seguiu-se um dia de trabalho remoto, possivelmente não o mais produtivo de sempre, mas necessário, já que não podia estar todos aqueles dias de férias.
O dia seguinte começou com algum trabalho também, mas era já o 21º do mês, e sendo assim tinha mais uma viagem pela frente, desta vez para a capital Polaca, Varsóvia.
Chegados à capital (desta vez fui acompanhado), não podíamos perder tempo. Fomos em busca do ponto de levantamento dos bilhetes a que tinha direito, e que se situava perto do estádio, mas não o do jogo. Depois de alguns autocarros e um número razoável de voltas a pé, acabámos por conseguir.
O sítio estava às moscas, não sei se pelo facto de não haver muitos adeptos Portugueses com aquele tipo de bilhetes (que seguiriam a equipa até onde fosse) ou se estaria simplesmente atrasado (ou até mesmo adiantado). Os voluntários esperavam ansiosamente a chegada de alguém ("Finalmente!", desabafavam alguns deles, claramente pouco habituados aos horários dos Portugueses), e quase que tivemos direito a passadeira vermelha, tal a importância com que nos trataram.
Por fim tinha os bilhetes na mão. Na viagem de autocarro que se seguiu, o estádio mostrava-se mais e mais, com a aproximação, e o nervosismo aumentava.
Todavia, esse nervosismo nunca esteve muito alto, até ao jogo. Talvez por estar constantemente, nos dias anteriores, em viagem, e ao consequente cansaço, acabei por nunca me dedicar às preocupações que geralmente precedem estes jogos.
Isso e o facto de estar consideravelmente confiante numa vitória. Depois daquela vitória frente aos Holandeses estava convicto de que teria de fazer pelo menos mais uma viagem neste torneio.
Pensando bem, talvez o facto de estar acompanhado de uma certa e determinada jovem que nutre pelo futebol pouco mais que indiferença me fizesse guardar as emoções para mais tarde.
Já dentro do estádio Nacional encontrei o conviva ao lado de quem vira o jogo frente à Dinamarca, em L'viv, e que já voltara a encontrar em Kharkiv. Ambos esperávamos ter, uns dias depois, mais um encontro de ocasião num outro estádio.
E então o nervosismo tomava definitivamente forma. O estádio estava basicamente dividido entre os Polacos e os seus vizinhos Checos, com uns quantos Portugueses dispersos. Um ambiente complicado, que se fazia sentir facilmente quando os Checos decidiam gritar pelo seu país. Para os acalmar, só mesmo os Polacos, que os interrompiam com cânticos pela sua "Polska".
Este ambiente era extremamente frustrante. Estando os Portugueses dispersos, ainda menos poderia esperar em termos de apoio à equipa. Eu, geralmente pacato e pouco efusivo nos cânticos durante os jogos, vi-me obrigado, de forma inédita, a levar a cabo várias tentativas de apoio a Portugal, porque já estava a ficar com um certo zumbido nos ouvidos por ter o estádio a ecoar algo que se assemelhava a "xéxi". No fundo, para mim os gritos dos Checos estavam já a soar a vuvuzelas.
Mas, como seria de esperar, os meus gritos por Portugal ganhavam, na melhor das hipóteses, apenas um pouco mais de força quando meia dúzia de Portugueses nas redondezas juntavam as suas vozes à minha. Eram, no entanto, gritos de pouca dura, já que as "vuvuzelas" voltavam pouco depois.
No que toca a futebol, sustive a respiração algumas vezes durante a primeira parte, com lances potencialmente perigosos por parte dos Checos, mas Portugal não demorou muito a tomar conta do jogo. Via-se bem quem era a melhor equipa, mas os lances de perigo escasseavam. O bloqueio esteve perto de terminar mesmo no final da primeira parte, com Ronaldo a protagonizar um grande lance em que envia a bola ao poste, mostrando que a pontaria mantinha a toada do jogo anterior.
Talvez esse lance tenha ajudado, porque na segunda metade a equipa estava ainda com mais vontade de resolver o assunto e provar que era melhor.
Começou logo com uma ocasião desperdiçada pelo Hugo Almeida e, pouco depois, Ronaldo atirou, de livre, ao poste mais uma vez, fazendo de Portugal a equipa que mais vezes acertou nos postes numa fase final de um campeonato da Europa, tendo-o feito por seis vezes.
Várias ocasiões de golo desperdiçadas e uma exibição enorme do capitão da República Checa, Petr Čech, estavam a deixar-me algo nervoso e impaciente. Mas, já perto do fim, o capitão Checo não conseguiu parar um grande cabeceamento do nosso capitão. Finalmente a minoria Portuguesa, agora devidamente acompanhada por boa parte dos Polacos (pelo menos pela parte que me interessava), fazia-se ouvir.
Uma vitória difícil, mas inteiramente merecida, com Ronaldo mais uma vez decisivo.
E naquele momento a alegria era imensa, sabendo que teria pela frente mais uma viagem até aos confins da Ucrânia.
Até breve!
1 observação(ões) de carácter irónico ou mordaz:
Ainda bem que voltaste, gostei da descrição, mas principalmente das fotos dos intervenientes na história. Bjs.
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